quarta-feira, 26 de agosto de 2015

Milhões de Estrelas

”Eles, revendo a estrela, alegraram-se imensamente”
(Mt. 2, 9b-10)
As estrelas sempre estiveram presentes na espiritualidade dos povos e igrejas inspirados na tradição bíblica. No livro do Gênesis, Deus fala a Abraão: “Olhe para o céu e conte as estrelas, se é que pode contá-las.” E prossegue: “Assim será a sua descendência” (Gênesis 15,5). As estrelas também motivam o cantar do salmista: “ele conta o número das estrelas, e chama cada uma por seu nome” (Salmo 147,4).
A espiritualidade que provém da mística das estrelas revela-se na ternura e no cuidado de Deus para com a natureza e a humanidade. É bom deixar-se seduzir pelas maravilhas que as estrelas nos revelam: têm habitação nas alturas, estão acima, lá no alto; brilham na escuridão da noite; iluminam e apontam caminhos; são de diferentes magnitudes: pequenas e grandes, cada uma com seu brilho e calor próprios.
A estrela que os magos seguiram na busca pelo menino que nasceria em Belém não apenas guiou-os pelo caminho como revigorou a esperança deles no encontro tão esperado com o Deus nascido. “E eis que a estrela que tinham visto no Oriente ia à frente deles, até que parou sobre o lugar onde se encontrava o menino. Eles, revendo a estrela, alegraram-se imensamente.” (Mt 2, 9b-10). Que triste seria o caminho dos magos não fosse o encantamento pela presença das estrelas.
Todos nós, seres humanos, em essência, somos seres solidários, dotados de disposição e entusiasmo para iluminar caminhos e construir uma civilização de amor. No amor fomos gerados/as, do amor nascemos para difundir a solidariedade entre os povos, sem distinções. Se o amor irradia alegria, conduz para caminhos de solidariedade, então somos como estrelas. Humanas estrelas!
Hoje, sabe-se que as estrelas emitem sons. Se nossos ouvidos fossem capazes de ouvi-los ficaríamos maravilhados com sua melodia, entoando notas de denúncia pela situação enfrentada por 850 milhões de pessoas que ainda sofrem os efeitos da fome no mundo. No Brasil ainda são 13 milhões as pessoas que passam fome diariamente.
Nesse contexto de encantamento pelos caminhos que as estrelas nos indicam, a Cáritas Brasileira lança, com ousadia e esperança, o projeto 10 MILHÕES DE ESTRELAS, como uma ação permanente, a ser realizada a cada ano, na perspectiva da espiritualidade, da promoção da paz e da justiça social.
A PAZ será sempre o tema central do Projeto. Mas, junto com esse tema, a cada ano serão assumidos temas sociais que tornem concreta a promoção da paz e o compromisso com os empobrecidos.
Em 2014, assumimos o tema da Campanha Mundial da Cáritas Uma Família Humana: pão e justiça para todas as pessoas. Assim, espera-se que o Projeto adote um processo pedagógico para pautar questões que atentam contra a vida e a dignidade das pessoas, mas que também provoque a solidariedade, formando uma verdadeira constelação humana, pela Paz e contra a fome e a pobreza extrema.
Seremos milhões de estrelas, milhões de vozes, milhões de pessoas acendendo a luz da solidariedade. Formaremos uma constelação solidária por e para todas as pessoas que estão fora da Mesa, por não terem pão em quantidade e qualidade para si e sua família e nem justiça para garantir seus direitos.
O gesto que identifica os participantes dessa constelação solidária é acender uma vela na noite de Natal, nas casas, nas praças, nas ruas, nas comunidades, nas praias, nos cantos e recantos das cidades e dos campos. Será um gesto concreto de nossa solidariedade, uma prática de sensibilização da sociedade e de todas as pessoas como uma só família humana. Quanto mais forem as estrelas, mais iluminarão. A cada ano faremos esse gesto concreto coletivo de paz e unidade, por outro mundo que já estamos construindo.
Na mesa deve haver lugar para todas as pessoas. Basta distribuir o pão e promover a justiça. A alegria do Natal será completa quando todas as pessoas, em cada território e em toda a Terra, tiverem alimentos à mesa e quando o reino da justiça gerar a alegria de sermos parte de uma única família humana.
Convidamos você a fazer parte dessa constelação. Na noite do Natal, faça brilhar a estrela da paz e da solidariedade.

História 

Este projeto teve sua origem em Annecy (França) em 1984, durante o tempo do Advento. Em 1991, a campanha alastrou-se por toda a França e passou a ser realizada no período do Natal.
É no ano de 2002 que a iniciativa inicia o seu percurso pelo mundo. Primeiro na Europa, quando cerca de 60 Cáritas promovem ações conjuntas para a iluminação de diversos espaços públicos. No ano seguinte, em 2003, o projeto ganha força e alastra-se pelo resto do mundo, dando, desta forma, visibilidade ao empenho da rede Cáritas a favor da paz e da solidariedade. É também neste ano que Portugal adere ao projeto . O principal propósito é sempre a sensibilização de toda a população para a importância dos valores da solidariedade e da paz.
A Cáritas Brasileira abraça esse projeto e inicia,em novembro de 2014, uma nova caminhada, rumo a milhões de estrelas, milhões de luzes brasileiras pela paz e pelo fim da fome no mundo. Será garantida sua continuidade a cada ano, na perspectiva da espiritualidade, da promoção da paz e da justiça social.
Assim, espera-se que o Projeto 10 MILHÕES DE ESTRELAS adote um processo pedagógico para pautar questões que atentam contra a vida e a dignidade das pessoas, mas que também provoque a solidariedade, formando uma verdadeira constelação humana, pela Paz e contra a fome e a pobreza extrema.

Oração

Senhor Deus de ternura e bondade!
Nós vos louvamos e agradecemos porque nos revelastes vosso mistério de amor em Jesus, vosso Filho e nosso Salvador.
Alegres, proclamamos que Ele é a luz do mundo.
Confiantes, ousamos dizer: nós somos luz do mundo, como Ele nos pediu.
Nesta Noite de Natal, pela luz desta vela, abençoai nossas vidas e de nossas famílias.
Ajudai-nos Senhor, pela força do Evangelho: a sermos luminosos/as e a espalhar a luz do Amor e da Justiça; a sermos como estrelas na Terra, promovendo a Paz e o fim da fome no mundo;
E assim, sermos uma só Família Humana, com pão e justiça para todas as pessoas.
Amém.

CNBB – Ano da Paz

A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) proclamou 2015 como o Ano da Paz. Com início no dia 30 de novembro de 2014 e estendendo-se até o Natal de 2015, é um momento de reflexões, orações e ações sociais que devem contribuir na superação da violência e para despertar para a convivência mais respeitosa e fraterna entre as pessoas.
Esse período foi aprovado por unanimidade durante a 52ª Assembleia Geral da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), ocorrida de 30 de abril a 9 de maio de 2014.
Dom Leonardo Steiner, bispo auxiliar de Brasília e Secretário-geral da CNBB, descreve no texto-base do Ano da Paz, que o “grito silencioso de paz, ‘Somos da Paz’, se eleva frente à violência crescente em todos os níveis. Violência de morte, de abuso de poder, de descarte da pessoa, de quebra das relações de confiança, de desagregação da família, de ganância e corrupção, de marginalização da infância e da adolescente”.
Nesse sentido, foram apontadas ações e atividades a serem realizadas durante este ano. Entre elas, está a Caminhada pela Paz, que teremos a alegria de realizar junto com o nosso projeto 10 milhões de estrelas.

Violência no País

A violência é um fenômeno histórico e suas causas estão associadas a problemas sociais como miséria, fome e desemprego. Embora os fatores econômicos não sejam os únicos determinantes, a ausência ou ineficiência de políticas públicas e de segurança agravam o quadro. É necessária uma participação mais forte da sociedade nas discussões que buscam saída para esses problemas.
Superar as múltiplas formas de violência que agridem a dignidade dos filhos e filhas de Deus e despertar a convivência fraterna entre as pessoas é o objetivo do Ano da Paz, que se soma ao projeto 10 milhões de estrelas. De acordo com os últimos dados do Mapa da Violência, mais de 56 mil pessoas foram assassinadas no Brasil em 2012. Os jovens são os principais afetados neste contexto, somando mais de 27 mil vítimas naquele ano. O mesmo relatório aponta cinco mortes por disparo de arma de fogo a cada hora no país.
Outro dado alarmante é sobre a violência contra as mulheres, que segue vitimando milhares de brasileiras reiteradamente: 43% das mulheres sofrem agressões diariamente. Esses dados foram revelados no Balanço dos atendimentos realizados em 2014 pela Central de Atendimento à Mulher – Ligue 180, da Secretaria de Políticas para as Mulheres da Presidência da República (SPM-PR).


Juntos, os projetos 10 milhões de estrelas e Somos da Paz unem-se a favor da paz, representando nosso desejo por um mundo mais justo e igualitário.

segunda-feira, 24 de agosto de 2015

Representantes das Cáritas do Nordeste se reúnem em mais um Inter-regional

19 de agosto de 2015
Foto Inter 05
Com o objetivo de aprofundar a temática sobre o voluntariado, realizar a preparação para XX Assembleia Nacional da Cáritas Brasileira e monitorar o plano operacional de 2015, as Cáritas Regionais do Nordeste se reuniram, em Recife, nos dias 13, 14 e 15 de agosto, para mais um Encontro Inter-regional. A equipe do Nordeste 2 foi responsável pelo acolhimento deste ano.
O evento contou com a participação de representantes dos cinco regionais que compõem o Nordeste: Maranhão, Piauí, Ceará, Nordeste 3 (Bahia e Sergipe) e Nordeste 2 (Paraíba, Alagoas, Pernambuco e Rio Grande do Norte), além da presença do assessor da Cáritas Nacional, Fernando Zamban. Estiveram presentes agentes de Cáritas arquidiocesanas e diocesanas, de colegiadas, de equipes e de conselhos regionais, totalizando mais de 50 pessoas.
A metodologia trabalhada durante todo o encontro foi referenciada por momentos de reflexão para a preparação da XX Assembleia Nacional da Cáritas Brasileira, que acontecerá de 12 a 15 de novembro de 2015, em Brasília. Os participantes fizeram um caminho metodológico e místico baseado na vivência de lugares bíblicos (Belém, Galileia, Betânia, Jerusalém e Emaús) para suscitar o debate e as análises sobre os processos e as instâncias de gestão da Rede Cáritas. Cada experiência foi coordenada por um dos Regionais.
O Nordeste 2 conduziu a todas e todos pela trilha de Belém (Casa do Pão), onde os/as participantes foram convidados/as a olhar do local para o global, compreendendo a forma de gestão da Cáritas e como ela atua nas diferentes dimensões: econômica, política, cultural, ecológica e religiosa. De acordo com o secretário da Cáritas Regional Nordeste 2, Angelo Zanré, as expectativas para o encontro foram satisfatórias. “Sinto-me plenamente contemplado, porque aquilo que nós construímos foi realizado de forma coletiva e consensuada. Discutimos temáticas muito importantes, como, por exemplo, o voluntariado. Percebemos que este é um tema central e agora nosso desafio é avançar mais e ter uma política definida, que fortaleça os voluntários”, afirmou.
O caminho pela Galileia (Casa da Esperança) foi feito sob a coordenação do Regional Maranhão, oportunizando que as pessoas olhassem para o cotidiano e refletissem sobre a sustentabilidade política e econômica da Cáritas e o engajamento na transformação social, para organizar o projeto e incidir sobre a realidade. Segundo o secretário regional, Ricarte Almeida, a metodologia abordada foi um dos grandes destaques do encontro. “O que mais chamou a atenção foram os processos que facilitaram as discussões, que são o centro da ação Cáritas, baseada na vivência dos locais pelas cidades propostas. Eu acredito que tudo isso fez com que as reflexões ganhassem um elemento de arte, de lúdico e isso, pedagogicamente, é muito enriquecedor porque faz a compreensão se estruturar no sublime das pessoas. Eu saio deste encontro extremamente animado com o nível do debate, pois com a aproximação da Assembleia Nacional tivemos a oportunidade de discutir as prioridades, os avanços, as conquistas e também os desafios que temos pela frente”, pontuou.
O Regional Ceará convidou os/as participantes a trilhar por Betânia (Casa do Amor), marcando, assim, o terceiro momento do encontro. A trilha por esta casa contribuiu para a reflexão sobre a gestão compartilhada e organização em rede. Para a secretária, Patrícia Amorim, os momentos de mística foram de extrema importância para que cada participante pudesse entender a lógica do que será proposto na Assembleia Nacional, como também aprofundou a espiritualidade de cada um e cada uma.
Já a o caminho por Jerusalém (Casa da Misericórdia) foi facilitado por representantes do Nordeste 3, convocando a todos/as a pensarem sobre a dimensão do Poder, serviço para o bem comum, para as formas de organizar a exercer a liderança, e que favoreçam a participação de todas as pessoas. Ainda de acordo com a secretária Cátia Cardoso, o Inter-regional possibilitou discussões ricas, vivências de profunda contribuição para fortalecer a nossa caminhada. “Acreditamos que a missão da Cáritas está muito mais viva em nós depois deste encontro e como consequência disso haverá um fortalecimento da nossa incidência junto ao povo que tem os direitos violados, compreendendo que a defesa dos direitos humanos é a nossa grande luta”, disse.
Na última etapa, o Regional Piauí coordenou a trilha para Emaús (Casa da Solidariedade), que oportunizou o debate sobre o ser Cáritas em todo mundo e sobre a relação com as pastorais sociais e os outros organismos da Igreja para gerarmos pessoas libertadoras e amadas. “Este Inter-regional nos permitiu uma maior sintonia enquanto região Nordeste, a fim de garantir os processos e as pautas que a Cáritas Brasileira vem trazendo para a atuação em rede e isso é a grande riqueza deste encontro. Além disso, este é um espaço que vem se consolidando cada vez mais e vem nos dando uma condição de que sairemos daqui com proposições e indicativos para atuar nos regionais, a partir de pautas de focos definidos nesta coletividade”, elencou o secretário do Regional Piauí, Adonias Moura.
De acordo com Fernando Zamban, o Inter-regional foi, de fato, é uma preparação da Assembleia Nacional. “A mística e a espiritualidade da Cáritas tem sido cada vez mais incorporada no nosso dia a dia e não mais como um momento de celebração. Ela está enraizada tanto nos sujeito quanto na nossa prática e isso é fantástico para a continuidade da missão da Cáritas. Por outro lado, se não tivermos clareza disso não iremos muito longe e isso aqui ficou muito entendido para as pessoas que participaram, pois foi visto que existe um sentimento muito grande de pertença à Cáritas que são envolvidos pela espiritualidade”, finalizou o assessor.  
O último dia do evento foi dedicado ao monitoramento do planejamento do primeiro semestre de 2015 e a organização das atividades, em âmbito regional NE, para os próximos meses do ano. Todos e todas saíram com compromissode buscar concretizar as ações definidas coletivamente. Em 2016, o Nordeste 3 irá acolher os outros regionais para a realização de mais um Inter.
Texto: equipe de comunicação da rede Cáritas | Diana Cavalcante (Regional Piauí), Kilma Ferreira e Lidiane Santos (Regional Nordeste 2), Iasmin Santana e  Alan Lustosa (Regional Nordeste 3)
Fotos: Allan Lustosa 

terça-feira, 18 de agosto de 2015

Os cinco fatores fundamentais da atual crise hídrica, por Gogó

Roberto Malvezzi (Gogó)*
05/08/2015

São cinco fatores fundamentais que geram a atual crise hídrica brasileira. O primeiro, alertado por vários cientistas, é a possível ruptura no ciclo de nossas águas. Em resumo, grande parte delas tem origem na evapotranspiração da floresta amazônica, sendo carreada para o sul, centro-oeste e sudeste pelos rios voadores. Com a derrubada da floresta amazônica os rios voadores estão perdendo força.
Completa essa ruptura o desmatamento do Cerrado, que tem como consequência sua impermeabilização. O Cerrado não está na origem do ciclo de nossas águas, mas tem o papel fundamental de armazená-las em tempos de chuva e depois liberá-las para nossas bacias hidrográficas em tempos de estiagem. É o que os técnicos chamam de vazão de base. Ela garantia a perenidade de nossos rios, a exemplo do São Francisco. Hoje porém, com menos absorção, não garante mais.
O segundo fator é a escassez qualitativa. Destruídos, poluídos, muitas vezes os mananciais estão ao lado de nossas casas, cortando nossas cidades, mas impróprios para o consumo humano e doméstico. O exemplo mais clássico são as águas do Tietê do Pinheiros em São Paulo. Mas podemos estender essa lógica a todos os rios que atravessam centros urbanos, desde os pequenos até os grandes.
O terceiro fator é a expansão do uso da água para fins econômicos, particularmente a agricultura irrigada. Hoje temos 6 milhões de hectares irrigados e eles são responsáveis por 72% da água doce consumida no Brasil. Entretanto, estudiosos dizem que temos potencial para mais 29 milhões de hectares – outros falam em 60 milhões -, sobretudo no território do agronegócio chamado de MATOPIBA, iniciais de Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia.
O quarto fator é o hidronegócio. A mercantilização da água despertou cobiça no mundo inteiro em seus múltiplos usos, particularmente dos serviços de abastecimento urbano e na água envazada. Quando um bem essencial à vida como a água é apropriado privadamente e mercantilizado, passa a ser gerido pelas regras absolutistas do mercado. A consequência é o preço exorbitante da água para populações mais pobres e o lucro soberbo das empresas que adquirem esses serviços. O que aconteceu em Itu e nas periferias da grande São Paulo ilustram esse fator de forma cabal.
Finalmente, o descuido. Não temos nenhuma política de educação, ética do cuidado com nossos mananciais ou a utilização de nossas águas. Mesmo quando a questão é abordada, simplesmente prefere-se transferir o problema para os consumidores domésticos, exatamente a parte menos influente na crise.
A ruptura do ciclo das águas + escassez qualitativa + expansão da demanda + hidronegócio – cuidado. Eis a equação da crise perfeita e perversa.


* Membro da Comissão Pastoral da Terra (CPT)

quinta-feira, 13 de agosto de 2015

Margaridas Marcham pela Convivência com o Semiárido

Trabalhadoras rurais do campo, da floresta e das águas ocupam as ruas por direitos!
Catarina de Angola e Monyse Ravenna - Asacom
Brasília - DF
12/08/2015
“Não faz muito tempo, seu moço
Nas terras da Paraíba
Viveu uma mulher de fibra
Margarida se chamou
E um patrão com uma bala
Tentou calar sua fala
E o sonho dela se espalhou
(...) E quando na roça da gente brilhar as espigas
Vai ter festa e nas cantigas
Margarida vai viver
E quando na praça e na rua florir Margaridas
Vai ser bonito de ver
Vai ser bonito de viver!”

(CANÇÃO PARA MARGARIDA/Zé Vicente)

Jovens, idosas, mulheres indígenas, quilombolas, ribeirinhas, pescadoras, extrativistas, quebradeiras de coco, assentadas da reforma agrária, assalariadas rurais, agricultoras familiares, camponesas. Mulheres de todas as idades: meninas, jovens, velhas. Cerca de 70 mil mulheres ocuparam as ruas da capital federal, na manhã de hoje (12) em uma marcha que coloriu Brasília, em um momento de expressão pública da capacidade de mobilização e da expressão política das mulheres rurais. 


Mulheres que vieram de todas as partes do país e de alguns países do mundo, as decididas, com uma pauta concreta de reivindicação e uma agenda de lutas que não começou, nem se encerra com a mobilização. Francisca Souza, 68 anos, veio Tocantins pela segunda vez para marchar com outras Margaridas. A distância não a impediu de seguir com as companheiras. “Estou aqui porque não perco mais uma Marcha das Margaridas. Venho porque aqui é do lado dos trabalhadores do campo e eu gosto do campo”, afirmou.



As margaridas marcharam (e marcham!) pelo desenvolvimento sustentável, pela democracia, justiça, liberdade, autonomia, igualdade, em defesa do meio ambiente, pela Reforma Agrária, sempre pela ótica das mulheres. Marcham pela democracia! E marcham pelo fim da violência machista que agride e mata mulheres todos os dias por todo o país. Marcham contra o agronegócio, os transgênicos e os agrotóxicos. Marcham contra o modelo de desenvolvimento capitalista e patriarcal que privilegia a concentração de terra e de riquezas e gera pobreza e desigualdades. “O campo está em disputa também com as multinacionais do país que acham que vão seguir concentrando terras”, afirmou Alessandra Lunas, Secretária de Mulheres da Confederação Nacional dos Trabalhadores e Trabalhadoras da Agricultura (Contag).

Participante de todas as marchas, Otávia veio do Maranhão.
Foto: Catarina de Angola
Marcham em respeito à diversidade racial, étnica, geracional, cultural e pela autodeterminação dos 
povos. Marcham pela Vida! Otália Souza Lima, 70 anos, é quilombola da comunidade de Prequeu, em Viana, no Maranhão, e veio para sua quinta marcha. Não perde uma edição. “Estou aqui hoje porque não podia em momento nenhum deixar essa marcha passar. Porque é a nossa luta e vivemos lutando pelo nosso território, pelos nossos direitos. A gente precisa exigir mesmo, porque pra nós não é pedido, não estamos pedindo, estamos exigindo nossos direitos. Estamos aqui para cobrar e este é um momento especial para nós trabalhadoras”, afirmou.

“Não é possível mais aceitar uma sociedade em que as mulheres vivem na situação de exclusão, com mulheres ganhando menos, com menos acesso às políticas públicas, com menos crédito e assistência técnica. São várias dívidas que a sociedade e o governo têm com as mulheres rurais e só vai mudar com a gente marchando”, Beth Cardoso, do grupo de trabalho de Mulheres da Articulação Nacional de Agroecologia (ANA) e do Centro de Tecnologias da Zona da Mata de Minas Gerais (CTA).
Além de marchar pelas ruas de Brasília as Margaridas realizaram várias atividades no estádio Mané Garrincha. Desde a reforma para Copa do Mundo essa é a primeira vez que o estádio foi usado em uma atividade da sociedade civil. Na abertura no dia 11, o ex-presidente Luís Inácio Lula da Silva afirmou: “se tem uma coisa que o povo brasileiro aprendeu nos últimos anos foi fazer sua própria história. Cansamos de ser coadjuvante resolvemos de que era possível realizar nossos sonhos e até eleger uma mulher, apesar de muitos não quererem, que aos 20 anos foi presa e torturada.

Com a força do povo e com a coragem e garra das mulheres não vamos deixar ninguém atrapalhar o processo de construção democrática. O povo não saqueia, o povo trabalha. Vocês têm conquistas a cada marcha. Incomoda demais que uma menina nascida no Sertão pode ser doutora hoje.”, disse Lula.

Ainda na abertura da Marcha, Patrus Ananias, Ministro do Desenvolvimento Agrário (MDA), em resposta a pauta das Margaridas afirmou, “trago a mensagem de solidariedade e compromisso com a luta pela reforma agrária. Estamos com o compromisso de assentar todas as famílias acampadas hoje no território nacional até o final do mandato”, garantiu.
“Água limpa sem privar / Sede de todos acalmar / Casa justa pra crescer, Casa justa pra crescer Saúde antes de adoecer” - As Margaridas também marcham em defesa da política de convivência com o Semiárido que vem sendo implementada e fortalecida nos último 15 anos em resposta ao passivo histórico do Estado brasileiro com o Semiárido e, sobretudo, com a vida das mulheres, que veem suas vidas transformadas pelas ações de acesso à água, representadas, principalmente pelo Programa Um Milhão de Cisternas (P1MC) e Uma Terra e Duas Águas (P1+2), que fortalecem a autonomia e contribuem para uma diminuição do trabalho das mulheres em buscar água, muitas vezes percorrendo grandes distâncias e possibilitando, inclusive a geração de renda no arredor de casa, além de possibilitar a garantia da segurança e da soberania alimentar e o fortalecer a agricultura familiar como modo de produção das famílias e das mulheres do Semiárido. "Não pode haver redução nesses programas que caminham para garantia da soberania alimentar e nutricional. E precisamos tirar a reforma agrária do volume morto", reforçou em sua fala a presidenta do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea), Maria Emilia Pacheco. 

Cristina Nascimento, coordenadora executiva da Articulação Semiárido Brasileiro (ASA) pelo estado do Ceará, afirma: “Trazemos a expressão das mulheres do Semiárido e estamos aqui reafirmando os programas de convivência com o Semiárido, os quintais produtivos, as tecnologias que contribuem efetivamente para a qualidade de vida as mulheres. Precisamos continuar avançando na erradicação da miséria e pobreza com a permanência dos programas de convivência, especialmente os programas de primeira água e segunda água que pautam a segurança alimentar. ”, concluiu.

A agricultora Luciana Pereira da Silva, 30 anos, paraibana como Margarida Alves, veio de Cubati para sua primeira Marcha das Margaridas. Ela que produzia com uso de agrotóxicos e sentia seus efeitos na saúde, passou a produzir no próprio quintal a alimentação para a família a partir da conquista de uma cisterna de água para a produção e agora sem o uso de veneno. “A gente tá querendo igualdade entre nós. A igualdade ainda está distante, mas a gente tem que lutar pra isso. A gente tem que lutar contra os preconceitos que tem na nossa sociedade pra que eles não existam mais. Eu e muita gente aqui viemos para que os projetos de convivência com o Semiárido continuem, para que eles não parem. E tem muita gente que já revende no final de semana, a partir do que produz no seu quintal, com água das cisternas”.

A presidenta Dilma Rousseff em seu pronunciamento às Margaridas na tarde desta terça-feira (12) se comprometeu em implementar 100 mil cisternas de captação de água da chuva para o incentivo à produção de alimentos até o final do seu mandato em 2018. Colocou também que irá continuar trabalhando no Programa Nacional de Redução de Agrotóxicos (Pronara) para o incentivo à produção orgânica e agroecológica.

“A marcha é uma chegada e uma partida. Aqui recarregamos as energias, revigoramos nossa esperança e militância e reafirmamos que a rua é o lugar da luta e o lugar de reafirmar nossas bandeiras. Voltamos daqui para as dinâmicas da ASA e essa marcha tem que permanecer latente. A gente volta com esse desafio da marcha continuar nos nossos estados, nas nossas comunidades”, afirmou Cristina.

A Marcha das Margaridas também teve o desafio de acontecer em um contexto social de político e fortalecimento do conservadorismo, do fundamentalismo e machismo na sociedade brasileira e nas instâncias de poder como o Congresso Nacional que avança contra os direitos e as políticas historicamente conquistadas por trabalhadoras e trabalhadores do campo e da cidade, a Marcha, nesse sentido, também se configura como espaço de unidade das mulheres rurais e do conjunto da classe trabalhadora e da construção de um país soberano e igualitário entre homens e mulheres.

“Até que todas sejamos livres nós temos que estar em Marcha”, reafirma Beth Cardoso. E pontua: “tivemos muita conquistas, mas ainda precisamos caminhar mais”.

segunda-feira, 10 de agosto de 2015

O amor é nossa missão: a família plenamente viva

Dom Roberto Francisco Ferreria Paz 
Bispo de Campos

Iniciamos neste domingo com o tema acima proposto a semana nacional da família, que é o mesmo que iluminará o VIII Encontro Mundial das famílias com o Papa Francisco, em Philadelphia, no mês de setembro. É importante afirmar que a família tem como missão irradiar e educar para o amor, pois ela transparece a caridade agápica do Pai e a comunhão da Santíssima Trindade da qual é um ícone convincente e sempre revelador.

Mas é oportuno e urgente testemunhar que está plenamente viva, diante dos agoureiros Pós-modernos que vaticinam que ela já era, profecia mandada pelos engenheiros sociais que sabem que para dominar um povo e explorar suas riquezas é necessário eliminar a sua força como pensava o Faraó do Egito. Tratam de desprezá-la denominando-a de família tradicional, ou ainda propagando aos quatro ventos que há vários modelos de família e uma diversidade de sexos.
Tem se chamado este processo de desconstrução da família, de liquefação de sua estrutura normativa, rompendo com as funções e relacionamentos básicos e permanentes da paternidade e maternidade, filiação e fraternidade, nupcialidade e conjugalidade. Mas ela mostra uma resiliência assombrosa, como aquele boneco João Teimoso, ela se inclina para um lado ou para outro mas volta a ficar sempre de pé, provando que a primeira instituição desejada e querida por Deus tem uma arquitetura e um DNA divinos, sendo impossível destruí-la totalmente. É pena que autoridades e governantes se esqueçam disto e que não só não apóiem a família,  mas a condenem a marginalização ou a dependência.
Enquanto não a tornarmos sujeito e protagonista das políticas públicas defendendo seus direitos fundamentais, teremos o dissabor de vermos a violência aumentar, a irresponsabilidade e o descaso com as crianças e os idosos chegar a situações degradantes, a cidadania ficar refém dos corruptos e vende pátrias, e o patrimônio público ser inescrupulosamente escorraçado.
Um projeto sério e claro de Nação passa por defender e anunciar a beleza de ser e de ter uma família, o caminho de reconstrução do Brasil, do resgate da ética e da salvação da terra, tem o mesmo logradouro e meta: a civilização do amor centrada na família comunidade de pessoas unidas pelo sangue e pela fé, pelos vínculos duradouros da conjugalidade e do matrimônio, da aliança amorosa e permanente. Obrigado pela vocação e missão das famílias brasileiras. Deus seja louvado!

http://www.cnbb.org.br/artigos-dos-bispos-1/dom-roberto-francisco-ferreria-paz-1/17086-o-amor-e-nossa-missao-a-familia-plenamente-viva