Roberto Malvezzi (Gogó)*
05/08/2015
São cinco fatores fundamentais que geram a atual crise hídrica
brasileira. O primeiro, alertado por vários cientistas, é a possível
ruptura no ciclo de nossas águas. Em resumo, grande parte delas tem origem na
evapotranspiração da floresta amazônica, sendo carreada para o sul,
centro-oeste e sudeste pelos rios voadores. Com a derrubada da floresta
amazônica os rios voadores estão perdendo força.
Completa essa ruptura o desmatamento do Cerrado, que tem como
consequência sua impermeabilização. O Cerrado não está na origem do ciclo de
nossas águas, mas tem o papel fundamental de armazená-las em tempos de chuva e
depois liberá-las para nossas bacias hidrográficas em tempos de estiagem. É o
que os técnicos chamam de vazão de base. Ela garantia a perenidade de nossos
rios, a exemplo do São Francisco. Hoje porém, com menos absorção, não garante
mais.
O segundo fator é a escassez qualitativa. Destruídos, poluídos, muitas
vezes os mananciais estão ao lado de nossas casas, cortando nossas cidades, mas
impróprios para o consumo humano e doméstico. O exemplo mais clássico são as
águas do Tietê do Pinheiros em São Paulo. Mas podemos estender essa lógica a
todos os rios que atravessam centros urbanos, desde os pequenos até os grandes.
O terceiro fator é a expansão do uso da água para fins econômicos,
particularmente a agricultura irrigada. Hoje temos 6 milhões de hectares
irrigados e eles são responsáveis por 72% da água doce consumida no Brasil.
Entretanto, estudiosos dizem que temos potencial para mais 29 milhões de hectares
– outros falam em 60 milhões -, sobretudo no território do agronegócio chamado
de MATOPIBA, iniciais de Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia.
O quarto fator é o hidronegócio. A mercantilização da água despertou
cobiça no mundo inteiro em seus múltiplos usos, particularmente dos serviços de
abastecimento urbano e na água envazada. Quando um bem essencial à vida como a
água é apropriado privadamente e mercantilizado, passa a ser gerido pelas
regras absolutistas do mercado. A consequência é o preço exorbitante da água
para populações mais pobres e o lucro soberbo das empresas que adquirem esses
serviços. O que aconteceu em Itu e nas periferias da grande São Paulo ilustram
esse fator de forma cabal.
Finalmente, o descuido. Não temos nenhuma política de educação, ética do
cuidado com nossos mananciais ou a utilização de nossas águas. Mesmo quando a
questão é abordada, simplesmente prefere-se transferir o problema para os
consumidores domésticos, exatamente a parte menos influente na crise.
A ruptura do ciclo das águas + escassez qualitativa + expansão da demanda + hidronegócio – cuidado. Eis a equação da crise perfeita e perversa.
A ruptura do ciclo das águas + escassez qualitativa + expansão da demanda + hidronegócio – cuidado. Eis a equação da crise perfeita e perversa.
* Membro da Comissão Pastoral da Terra (CPT)
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